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terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

"J'ai fait un rêve"

Estamos numa cafeteria bacana em Paris. Por alguma razão que só faz sentido na lógica onírica, um detetive brasileiro me acompanha. É um daqueles tipos broncos que usam chapéu e sobretudo, lembrando Dick Tracy ou alguma outra figura de um seriado B qualquer. O sujeito está na cidade investigando um crime cometido nas redondezas e precisa de um tradutor. Para a sorte do cara, essa é a minha profissão na Cidade das Luzes. Pois é, olha a tal distorcida realidade dos sonhos...

O homem solicita à atendente um grande pedaço de bolo de chocolate exposto na vitrine do estabelecimento. Eu traduzo o pedido à moça, com um impecável domínio da língua francesa. Na verdade era um conjunto de palavras desconexas com "blu" no final, mas se adequaram magicamente ao idioma local. Júlio Verne morreria de inveja. Abraços, xará.

- Foi essa piranha gorda que matou a menina, eu sei disso. - disse o investigador, em rude e não tão agradável português, enquanto encarava a atendente, com um sorriso cínico.

- Que nada, rapaz - respondi. - Eu sempre tomo café aqui, conheço a Marie "Blu". Ela é um anjo.

- Haja força nas asas pra carregar esse lombo.

- Ok, ok, pega leve. Je vous remercie, madame.

Pedi pra vilipendiada e rechonchuda atendente um pacote de pó de café pra reabastecer a dispensa do meu apê, que ficava há poucos metros dali. O imóvel tinha sido um achado: ótima vizinhança, bem localizado, muito próximo do comércio local e, pra completar a ilusão onírica, o valor do aluguel era bem razoável. A fantasia dos sonhos é como uma porrada na cara: lembra o quanto a vida é uma merda sob a ótica dos olhos despertos.

Recolhemos nossas coisas, pagamos a conta em Euros e continuamos nossa investigação criminal nos arredores de Paris.

Daí acordei do sonho psicodélico/noir, lembrei que moro na Praça Seca (a Paris de Jacarepaguá, se levarmos em conta o grande número de pombos), mal falo português e bebo café Pilão feito com coador de meia velha. Merde.